Percepção da dor
Home » Percepção da dorA dor é uma “experiência sensitiva e emocional desagradável, que é associada ou descrita em termos de lesões teciduais” (Merskey, 1979). A dor aguda envolve emoções e estados como ansiedade, alerta e estresse, e a dor crônica, sofrimento e incapacidade(Melzacket al., 2001), que invariavelmente agravam a condição dolorosa.
A percepção e o significado da dor são modulados por aspectos cognitivos, emocionais e culturais, podendo alterar a experiência dolorosa. A intensidade e caráter da dor são também influenciados pelas experiências anteriores.
A atenção é um fator cognitivo importante, a concentração em uma situação potencialmente dolorosa pode levar o indivíduo a sentir dores mais intensas.E a distração pode diminuir ou abolir a dor.
As emoções desagradáveis podem ser consideradas como defesas semelhantes à dor ou ao vômito: “… assim como a dor evoluiu para nos proteger de danos teciduais imediatos ou futuros, a capacidade de ansiedade evoluiu para nos proteger contra futuros perigos ou outros tipos de ameaças” (Nesse, Willians, 1997).
Pensamentos que influenciam a dor
A apreensão ansiosa associa-se a um estado de elevado afeto negativo e superexcitação crônica, uma sensação de incontrolabilidade e uma concentração da atenção sobre estímulos relativos à ameaça.
As preocupações excessivas características da ansiedade são definidas como “uma cadeia de pensamentos e imagens carregados de afeto negativo e relativamente incontroláveis. O processo da preocupação representa uma tentativa de solução mental de problemas sobre um tema cujo resultado é incerto, embora sugira a possibilidade de uma ou mais conseqüências negativas”. Portanto, a preocupação consiste em pensamentos contínuos sobre o perigo futuro que são experimentados como aversivos e relativamente incontroláveis.
Os temas de preocupação em pacientes com Transtorno de Ansiedade Generalizada, geralmente são doença, saúde e ferimentos.
Esta ansiedade e preocupações com saúde podem ser discutidas conforme algumas estratégias cognitivo-comportamentais.
O conceito de amplificação é útil para compreender as condições psicológicas e físicas caracterizadas por queixas somáticas desproprorcionais em relação à condição orgânica existente. Dentre as sensações sujeitas a amplificação estão as cefaléias, que podem ser experimentadas como mais intensas, nocivas e ameaçadoras. A amplificação caracteriza-se por
- uma propensão a vigiar em excesso o estado corporal, que está relacionada a um aumento da auto-avaliação e da focalização da atenção nas sensações corporais incômodas;
- uma tendência a selecionar e centrar-se em determinadas sensações e
- uma inclinação a considerar tais sensações como perigosas e indicadoras de perigo.
As interpretações catastróficas dos sintomas físicos podem ser uma percepção errônea de sinais corporais não patológicos como sinal de doença orgânica grave. O indivíduo desenvolve um viés ao dirigir sua atenção seletivamente para a informação que confirme a idéia de doença e que ignore aquela que evidencia seu bom estado de saúde. A ativação de crenças problemáticas provoca o surgimento de imagens desagradáveis e pensamentos automáticos negativos, cujo conteúdo implica numa interpretação catastrófica das sensações ou sinais corporais.
Dr Beck refere-se à catastrofização, como distorção cognitiva presente no indivíduo com transtornos de ansiedade. Os indivíduos ansiosos podem interpretar sensações somáticas normais como distorções catastróficas. A catastrofização tem sido estudada como o processo de pensamento que mais influencia a percepção da dor. Os indivíduos apresentam uma tendência a exagerar o valor da ameaça ou a gravidade das sensações de dor.
Sua atenção seletiva nas sensações corporais, como cefaléias, conduz a pensamentos automáticos
de ameaça iminente (“E se eu tiver um tumor cerebral”, “E se eu morrer?”). São pensamentos ameaçadores que influenciam a ansiedade em relação à saúde e suas correspondentes manifestações fisiológicas (por exemplo, tensão muscular e dor), cognitivas (por exemplo,preocupações), afetivas (por exemplo,ansiedade) e comportamentais (por exemplo,busca de informação médica tranqüilizadora). Esta cadeia de elementos provê mais combustível para os pensamentos de ameaça, conduzindo a um círculo vicioso, culminando em piora do quadro da ansiedade e da cefaléia.
Existe uma série de fatores que age perpetuando a preocupação com a saúde. De acordo com este modelo, podemos discutir que qualquer percepção da cefaléia pode ser um estímulo desencadeante, que, ao ser percebido como ameaçador, provoca no indivíduo temor e apreensão. Esta reação precipita uma série de processos fisiológicos, cognitivos e comportamentais. Primeiro, o aumento da excitação fisiológica implica em um aumento das sensações somáticas mediadas pelo sistema nervoso autônomo, o que pode fazer com que o indivíduo as perceba como uma patologia orgânica grave. Segundo, o fato de estar hipervigilante em relação à qualquer sinal de cefaléia e interpretá-lo como sinal de quem sofre de uma doença grave. Por fim, o comportamento de busca de informação tranqüilizadora de fontes médicas ou não médicas pode também contribuir para aumentar a preocupação com saúde.
Em resumo, a ansiedade antecipatória pode criar um viés de atenção no perigo e iminência de ameaça (crise de enxaqueca), este foco em sensações corporais leva a hipervigilância, aumenta a percepção, que pode ser crucial para o desenvolvimento e manutenção da ansiedade e cefaléia.A expectativa excessiva de ter crise de enxaqueca pode exacerbar ou potencializar a próxima crise.
Um estudo brasileiro sobre a prevalência da enxaqueca entre funcionários de um hospital universitário, referiu que mais de 40% dos enxaquecosos relatou medo de ter outra crise de enxaqueca e este medo é suficiente para eles pensarem sempre na cefaléia. A ansiedade está presente durante a crise de enxaqueca e também nos períodos intercríticos.
Os portadores de enxaqueca podem desenvolver estratégias comportamentais para lidar com a dor da cefaléia, como um comportamento evitativo, como o consumo de analgésicos e a utilização de serviços de saúde na tentativa de evitar a cefaléia. Porém, a conseqüência do uso excessivo de analgésicos pode ser a transformação da enxaqueca episódica em cefaléia crônica diária.
Exemplos de pensamentos que influenciam a dor
Pensamento |
Sentimento/Emoção |
Sensação física |
---|---|---|
Tenho que fazer tudo rápido. Não vai dar tempo. |
ANSIEDADE | TENSÃO MUSCULAR DOR DE CABEÇA |
Eu não vou conseguir. Não vai dar certo. |
ANSIEDADE | DOR |
As pessoas vão me criticar. Eu vou errar. Não vou fazer certo. |
ANSIEDADE | DOR |
Se não for perfeito, não adianta. Tenho que fazer tudo perfeitamente. |
ANSIEDADE | DOR |
Não posso mostrar fraqueza. Tenho que ser forte e fazer tudo sozinho. |
ANSIEDADE | DOR |
Vai acontecer alguma coisa de ruim com minha família. TEles vão ser assaltados. Eles vão ser atropelados. |
ANSIEDADE | DOR |
Eu vou morrer. Eu vou ser atropelado, assaltado, perder o emprego. A dor de cabeça deve ser um tumor e vou morrer. Minha saúde é ruim. |
ANSIEDADE | DOR |
Meu marido/esposa/ filho está fazendo uma coisa errada. Ele é mal. Ele é bagunceiro. Ele é mentiroso. Ele é burro. Ele não faz nada direito. |
RAIVA | TENSÃO MUSCULAR | DOR DE CABEÇA |
Ele está fazendo isso só para me irritar. Só porque sabe que eu não gosto. | RAIVA | DOR |
Ele deveria ter feito… Ele não deveria ter feito… As coisas devem ser do meu jeito. As pessoas tem que fazer as coisas como eu acho que devem ser. |
RAIVA | DOR |
É injusto. Ele está me mal tratando, me agredindo, me fazendo mal. Eu sou vítima. | RAIVA | DOR |